Qual é nosso futuro?
A história recente trouxe uma enorme destruição para os Guarani, com impactos que já causaram neles uma grande tragédia humana: foram expulsos de suas terras em ações rápidas e, em muitos casos, violentas, sem ter a possibilidade de voltar aos seus assentamentos e sem poder buscar terras novas para se assentar de acordo com as suas necessidades. Tiveram que viver forçadamente em “Colônias” ou “Reservas” indígenas que, na realidade, eram e continuam a ser campos de refugiados. Muitas aldeias são áreas de confinamento. Não havia espaço suficiente para cultivar o necessário para sobreviver. Esta situação significava ter que viver junto com famílias de outras comunidades, com as quais, muitas vezes, houve relações de conflito.
A partir de 1960 até 1990, praticamente todo o sul do Mato Grosso do Sul, no Brasil, foi desmatado e essa destruição massiva se expandiu pelo Paraguai, onde toda a faixa do rio Paraná tornou-se um grande campo de soja e outras monoculturas análogas. Para os Guarani, isto significa a destruição do seu mundo. Habitantes da floresta, por excelência, sempre moraram e tiraram sua sobrevivência da floresta. Todos os seus conhecimentos, desde níveis muito práticos, sobre plantas e animais, até sua cosmovisão e sua espiritualidade, até hoje estão vinculados à mata, que não é apenas um lugar de fauna e flora, mas um espaço de seres sociais espirituais, guardiões de animais e plantas, com os que os Guarani se relacionam e dos que dependem para reproduzir o seu próprio sistema social.
Os Guarani, agora despojados dos seus cultivos, têm que comprar seus alimentos nos armazéns ou dos vendedores ambulantes.
Estas mudanças tão rápidas e profundas causaram nas populações Guarani desequilíbrio e desespero, que se manifestam em vários problemas sociais e de saúde:
- Aumento de suicídios, especialmente desde a década de 1990, com uma das mais altas taxas do mundo;
- Aumento dos conflitos de terra;
- Dependência crescente de governos e agências não-governamentais, geralmente de forma aberta e descaradamente assistencialistas;
- Aumento dos níveis de urbanização precária.
Um sintoma da deterioração da qualidade de vida dos Guarani também é visto no aumento do estabelecimento de grupos familiares muito pequenos, em moradias precárias, isoladas, geralmente construídas com materiais descartados, na beira das estradas e nas periferias das cidades e aldeias, onde as crianças, muitas vezes, têm de procurar no lixo alguma coisa para comer.
Na Bolívia, pelo contrário, a presença do povo Guarani, em nível nacional, atingiu um auge, tornando-os atores políticos importantes. Sua contribuição para o desenvolvimento humano e sustentável do leste da Bolívia é evidente.
Nestas condições, o que pode ser feito? Existem muitos povos no mundo que experimentaram situações parecidas, na maior parte dos casos provocados por uma guerra e, muitas vezes, também por despejos violentos, migrações forçadas e perseguição religiosa.
Entretanto, quando encontraram um lugar para viver e para se organizar de novo, em plena liberdade, não só se recuperaram em um tempo relativamente curto, mas foram capazes de desenvolver novas formas de vida, adequadas às novas circunstâncias.
As maiores ameaças para o futuro não só afetam aos Guarani, mas, também, a todos os habitantes da “nação guarani”, perante a destruição massiva do meio ambiente e da exclusão social e econômica de tantos concidadãos. Apoiando os Guarani em sua luta por um espaço de vida e defesa dos seus direitos, estamos fortalecendo a “nossa casa comum” e nosso próprio futuro. Assim, podemos afirmar que “somos todos Guarani”.